Pragmática em Discursos Midiáticos e Redes Sociais

A pragmática digital tornou-se essencial para compreender como usuários constroem sentidos em interações nas redes sociais, especialmente em ambientes caracterizados por brevidade, velocidade e forte presença multimodal. Postagens, comentários, memes, emojis e símbolos visuais funcionam como ferramentas pragmáticas complexas, capazes de expressar intenções, provocar inferências e moldar percepções públicas. Nesse cenário, compreender como esses elementos operam torna-se fundamental para analisar fenômenos como implicaturas em posts, ironia online, sarcasmo digital e efeitos comunicativos de imagens e emojis.

Infográfico sobre pragmática digital e discursos em redes sociais

1. Estratégias Pragmáticas em Postagens, Comentários e Memes

As redes sociais configuram um ambiente comunicativo dinâmico, no qual usuários recorrem a diferentes estratégias para transmitir sentidos — frequentemente mais implícitos do que explícitos. Esses recursos incluem pressuposições, omissões calculadas, uso de humor, pistas contextuais e referências intertextuais. Como observa Shifman (2014), os memes digitais só funcionam plenamente quando o público compartilha um repertório cultural e discursivo capaz de completar os sentidos não ditos.

“Memes online dependem de sua capacidade de despertar reconhecimento e ativar conhecimentos prévios que não são expressos diretamente. O significado do meme só se concretiza quando o usuário recupera, de forma implícita, as referências culturais e comunicativas envolvidas.” (Shifman, 2014)

Desse modo, memes e comentários irônicos não são apenas textos ou imagens: representam atos de fala multimodais, nos quais significado e intenção emergem da articulação entre fragmentos verbais, visuais e contextuais.

2. Implicaturas em Tweets e Posts: Tons Implícitos e Ironia Online

Plataformas como X (antigo Twitter), Instagram e TikTok favorecem enunciados curtos e altamente inferenciais. Assim, implicaturas conversacionais tornam-se estratégias privilegiadas para sugerir críticas, posicionamentos ou ironias sem formulação explícita. Muitos posts se tornam virais justamente por ativarem camadas de sentido que exigem do leitor interpretação inferencial.

“O falante frequentemente quer comunicar mais do que expressa literalmente, utilizando pistas contextuais e máximas conversacionais que orientam o público a inferir significados adicionais.” (Grice, 1975)

2.1 Implicaturas e leitura contextual

Nas redes sociais, a interpretação de mensagens frequentemente depende de aspectos como: o timing da publicação, eventos atuais, hashtags, marcadores de humor e até mesmo a identidade pública do autor. Uma frase aparentemente neutra pode carregar crítica velada, ironia ou sarcasmo em função do contexto.

2.2 Ironia online

A ironia digital costuma explorar a discrepância entre enunciado literal e intenção real. Conforme Sperber e Wilson (1981), a ironia funciona como um comentário “ecoico”, isto é, uma reação crítica ou distanciada a discursos ou expectativas anteriores.

“A ironia envolve uma dissociação entre a atitude real do falante e o conteúdo literal do enunciado, funcionando como uma resposta crítica a discursos previamente pressupostos.” (Sperber & Wilson, 1981)

3. Emojis, Símbolos e Recursos Visuais na Construção de Sentidos

Emojis, GIFs, stickers, imagens de reação e símbolos textuais são recursos pragmáticos fundamentais para a comunicação online. Eles atuam como marcadores de entonação, emoção, posicionamento e intenção comunicativa — substituindo elementos prosódicos presentes na fala.

De acordo com McCulloch (2019), emojis funcionam como gestos digitais, acrescentando nuances impossíveis de serem captadas apenas pela escrita linear.

“Emojis introduzem na escrita elementos que antes pertenciam apenas à conversação face a face, esclarecendo tons, modulando intenções e orientando a interpretação do leitor.” (McCulloch, 2019)

3.1 Funções pragmáticas dos emojis

  • Marcar emoção (alegria, sarcasmo, indignação, ironia).
  • Suavizar críticas (estratégias de polidez).
  • Intensificar elogios ou reclamações.
  • Sinalizar humor, exagero ou ambivalência.
  • Substituir tom e prosódia da fala.

Assim, emojis não apenas decoram textos: eles moldam diretamente a interpretação, podendo alterar completamente o sentido de uma postagem.

4. Multimodalidade e Construção de Significados: Memes e Imagens

A multimodalidade — combinação de texto, imagem, som e design — é central para o discurso digital. Memes, vídeos curtos, capturas de tela e montagens estruturam sentidos por meio de sobreposição de elementos que exigem leitura integrada. Crystal (2011) destaca que a linguagem da internet opera por camadas, nas quais significados visuais e verbais se reforçam mutuamente.

“A comunicação digital é intrinsecamente multimodal, e a interpretação de seus enunciados depende da integração entre elementos verbais, visuais e contextuais.” (Crystal, 2011)

4.1 O papel dos símbolos e formatos visuais

  • Screenshots funcionam como “provas discursivas”.
  • Montagens meméticas condensam críticas e humor.
  • Símbolos textuais (‘*’, ‘~’, maiúsculas, repetições) modulam tom e intensidade.

Esses recursos ampliam a capacidade expressiva e tornam a pragmática digital mais complexa e rica em nuances.

5. Considerações Finais

A pragmática em discursos midiáticos e redes sociais revela que os sentidos digitais dependem fortemente de inferências, pistas contextuais e repertórios compartilhados. Emojis, memes, imagens, implicaturas e ironias não são elementos superficiais, mas componentes centrais da construção de significados na comunicação contemporânea. Compreender como funcionam é fundamental para analisar práticas discursivas, relações sociais, disputas de sentido e estratégias comunicativas no ambiente online.


Referências

CRYSTAL, D. Language and the Internet. Cambridge: Cambridge University Press, 2011.

GRICE, H. P. Logic and Conversation. In: COLE, P.; MORGAN, J. Syntax and Semantics 3: Speech Acts. New York: Academic Press, 1975.

MCCULLOCH, G. Because Internet: Understanding the New Rules of Language. New York: Riverhead Books, 2019.

RECUERO, R. Redes sociais na internet. Porto Alegre: Sulina, 2018.

SHIFMAN, L. Memes in Digital Culture. Cambridge: MIT Press, 2014.

SPERBER, D.; WILSON, D. Irony and the Use-Mention Distinction. In: COLE, P. Radical Pragmatics. New York: Academic Press, 1981.

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